O passado


O tempo não passa. Nossas vidas se desintegram
rumo à sabe-se lá onde ou por quê.
E velhos amigos se reencontram, cada vez mais velhos
na plena juventude dos corpos e copos.

O tempo não passa. Quem passa somos nós que inventamos
o tempo, os deuses, as coisas todas.
E estou cada vez mais passado com este meu passado
e com os acontecimentos que hoje soletram o amanhã inexistente.

O tempo devora. Devora o seu próprio criador.
O companheiro a que me refiro trará revoluções
mas elas morrerão em um sonho de adolescente
como os meus morreram, para dar lugar ao que agora chamamos real.

O tempo, traidor. Nós devemos matá-lo.
Mas é o tempo que nos mata, inimigo.
O tempo, o ingrato que nos afasta da infância
onde éramos tão despreocupados e inoportunos
em cada oportunidade de aterrorizar e criar rugas
nas já desprezadas testas dos que o tempo já devorava.

O tempo não passa.
Ou passa até demais.
Tanto faz, no fim é só um termo.
E velhos amigos se reencontram
e logo não se reencontram mais.

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