O insensível e desprezível poema de um crítico de crítica, Ou, Nostalgia do que não ocorreu
Daí que quando tu escreve já não sabe pra quê
já nem sabe pra onde, muito menos pra quem
e desistindo, vai morrendo as palavras, e até o idioma,
e apaga verso ali, e apaga verso aqui, depois
já deprimido, quer fazer verso remido
copiar d'outro poeta, renovar a coisa velha
reler prosa antiga, dos anos dourados,
e pensando e pensando e pensando
que renovar a cópia não é pecado
muito menos plágio, se ninguém perceber.
Daí que quando as coisas estão bem, tu esquece
do poema, do problema, do dilema, do
soneto, do haicai, da terceira guerra mundial;
e não tem erro nisso não, poema bom vem de verso
deprimido, insensível, ou cansado,
ou quem sabe quando tu está parado
sobra tempo pra discutir sobre o cheiro do café
sobre assuntos filosóficos, sobre sentimento.
Daí que quando tu termina, todo contente com o feito,
olha bem, olha de novo, e então acha perfeito,
o transtorno vem depois, quando já relido, acha defeito,
e retira som dali, retira som do lado, e o verso depenado
fica todo condenado, sem sentido, sem contexto
mas tu divulga mesmo assim, e no fim:
vem sujeito requintado, ler conversa desfiada,
lê, relê, e não entende é nada
mas por vergonha ou por já estar condicionado
joga a crítica sobre a mesa:
- "que magnífico, que beleza"
e chama de pós-moderno
aquele lixo rascunhado no caderno.
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